sábado, 29 de fevereiro de 2020

Textos para reflexão



Textos para reflexão
                  

Quase impercebível

Ah! Só hoje; só hoje é que a mente cedeu espaço para que, o que vai reflita e agradeça ao que fica. E quero de maneira mais sincera e profunda dizer que a nada e a ninguém poderia dedicar tamanho empenho, mesmo sabendo que não conseguirei expressar tudo que mereces ouvir, pois foste e és o mais perfeito e obediente diante de todas as minhas vontades, caprichos abusivos e volúpias vãs, até com ousadia mister de quem ignora a disposição alheia.
Ah corpo! Como podes ser tão fiel a quem faz tanta exigência e até força à perfeição? Sabes que o próprio, não daria tanto sem algo em troca receber. Quando lembro que nunca me disseste um não, sinto em tua pele o quanto te devo em gratidão. Quando cansado, sem poder corresponder, ainda tinhas que ouvir murmúrios de quem por vezes, e por muitas vezes, não teve a capacidade de entender o quanto és apenas carne e osso num universo de uma natureza infrene onde tudo é transformável.
Nunca me desloquei sem necessitar de ti; mesmo nas mínimas locomoções, nos pequenos gestos e até no soltar de uma lágrima ou no ar de um sorriso, precisei que correspondesse a essa expressão. Já nas longas e duras jornadas, aí então, não tenho as necessárias palavras que possam mencionar o quanto foste companheiro irmão, tipo dois em um, enquanto viver. Agradeço também ao tempo, mesmo no final, pelo instante reflexivo e voltado para aquele que de mim nada exigiu.
Hoje irei, mas fique com a certeza de que alguém jamais teria sido tão prudente.
                     
       
      Eu e ele
  
 - ...?

 - Eu estou bem. Ao contrário deste velho corpo que perde a resistência e com ele quer me levar. É verdade, eu estou muito bem, mas ele não. Estou bem porque enquanto ele perde a capacidade de se reproduzir, eu me renovo e cresço, aprendo que não é com ele que devo ir, pois ele perece, eu vivo; e com o passar do tempo aprendo que a vida é para sempre. Lamento por ele, por saber que nasceu e vive para me servir. Foi companheiro inseparável e senhor do meu abrigo. Lembro-me das muitas vezes, as quais discordou de mim, geralmente querendo sempre o melhor e palpar o que a vida não parecia querer lhe dar. Olha, é impressionante como ele é fascinado pelo oposto; e que tem muito bom gosto eu não posso negar. Interessante é que esse seu bom gosto me balança e muitas vezes consegue me levar. Aqui pra nós, confesso que o agradeço, mas sem que ele perceba, porque é vaidoso e tentador. Também podera, a ele cabe o instinto, a mim, o raciocínio, que me dá forças para controlá-lo e mostrar-lhe que apesar de sermos dois em um, temos caminhos diferentes. Sei que é forte e quer me fazer seu escravo, porém, o que é para sempre não pode ceder e saciar-se apenas com os mesmos desejos que satisfazem, por momentos, àquele que vem, vive, mas se vai após um certo período.
      Não diria que estou feliz. Nem poderia. Seria um grave desequilíbrio meu num momento de reflexão. Como poderia dizer que estou feliz, se faltaram em minhas mãos tudo aquilo que poderia aliviar as míseras necessidades minhas e dos meus. Se a ele não pude saciar sequer um dos incontroláveis desejos que por tantas vezes o deixaram trêmulo ao vê. Trêmulo e exalante por sentir e não poder, porque dizem ser proibido.
      No mais, voltando-me à compreensão, posso dizer que estou bem.



                 
    
Por que não param?
                                                                                                                      
Enquanto os abarrotados pela dor e pelo impacto que castra os sonhos e a aspiração dos que ainda buscam algum significado do que é viver, gritam na solidão de um silêncio que não ecoa, os que almejam e sentem prazer no que destrói, avançam indiferentes com a apatia própria dos que enxergam os outros apenas como um lixo humano.
     Por mais que a história insista, não dá para conviver com uma facção que promove intermináveis valetas de enterros coletivos apenas por deleites extraídos da tritura dos que clamam por clemência. Há muitos argumentos tentando convencer, porém é em vão qualquer explicação diante da ganância de possuir o que não lhes pertence. Só os fragilizados pela desilusão de sonhos palpáveis, entre racionais, lacrimam viver num covil onde os de lá não sentem a dor alheia.
Que gene será que lhes falta para que a indiferença seja a base de suas vitórias rudes, onde o produto final é um saldo de cadáveres e de vivos ressecados?
Por que não param? Talvez os que sofrem sejam frutos do destino do Faraó, ou de Esaú; e os que talham, sejam frutos dos que tiveram o coração endurecido.
                                                                                                                                                                                                          
     Ir

Em cada guerra existem apenas dois lados: o de cá e o de lá. Pode envolver-se o mundo todo, mas sempre só haverá o contra e o a favor. Os motivos variam, mas existe sempre uma sede comum entre elas. Tudo pode ser diferente em cada uma delas: épocas, alvos, soldados, motivos, ... tudo, mas a sede é sempre a mesma: o poder. Pouco importa quem vai ou quem fica. Não importa se machuca, se destroi ou sacrifica. Não importa o filho órfão ou a mãe que grita. Tem que ir, passar, chegar. A ordem é atirar e o alvo é o outro, o contra, que como o de cá não passa de um ser usado por um indiferente e frio grupo que tem como objetivo manter o domínio, mesmo que tenha de eliminar quase toda espécie humana; mesmo porque na concepção deles o povo e o policial não passam de instrumentos descartáveis e bonecos protetores.
Mas, se a guerra é natural, se desde séculos antes de Cristo, Deus escolhia os Seus e ordenava que vencessem os outros, temos que admitir que a história universal vem apenas ligando seus pontos pela força da natureza. Em suma: se a vida é um campo de batalha e a ordem é avançar, e se somos atores ou apenas figurantes, só resta a cada um prosseguir, ir ... tentar alcançar.
                                                                                  Sei lá

 Há milênios, desde a existência, o povo é lesado através de blá-blá-blá. Cada vez que ele fica mais arisco as teorias progridem. O homem público fica mais “comovido” e “sensível” à situação mísera da nação. Este é o lema de gerações e mais gerações, e até hoje as pessoas continuam rudes, cometendo a gravidade de os tornar líderes e até ídolos.
  É confuso vê que depois de tudo que a história tem nos mostrado através dos séculos, as pessoas, principalmente aquelas mais maduras no seu senso crítico, ainda venham acreditar que a solução esteja na implantação de um novo sistema. Não se pode acreditar que pessoas que se dizem está empenhadas na luta por um mundo justo se tornem um imenso comboio, sempre exposto a um novo jogo de laço.
  Não existe sistema político ideal. Qualquer um deles, já vindo ou ainda por vir, usou e usará o homem simples como alvo de suas projeções. Acreditar num sistema é se fazer presa fácil de dominar.
  Os séculos têm nos mostrado que seria amando uns aos outros que transformaríamos essa “cadeia alimentar” em um mundo de humanos. Que todos os recursos que possamos ter, ainda assim, é insuficiente sem a dosagem do coração.
                                                                                                                     
                      
        
Você concorda?
  
   Às vezes dá para sentir que o homem já encontrou sua definição, apenas não aceita ser um simples ente programado, pois assim, no seu modo de ver, se tornaria algo sem o seu suposto valor. Seria apenas servo e nunca senhor. Interessante é que este comportamento não é criado por ele próprio, mas recebido, para que viva tendo a impressão de que pode, com a busca, preencher o vácuo da sua insatisfação. É este comportamento que o impulsiona a escrever a página de sua vida numa folha que, sem saber, não está mais em branco, pois não admite ser um indivíduo criado para trilhar as pautas de uma história que já foi traçada e terá que ser concluída. Não admite está só a serviço, sem opção. Incomoda-se ao sentir que ao homem cabe a busca e ao Criador o adquirir; que, o conseguir é para os Escolhidos, aos anônimos, o em vão.
     Numa comparação concreta, vemos que apesar dos peixes serem todos peixes e viverem no mesmo ambiente, eles têm funções e poderes diferentes. Em relação aos homens, enquanto um nasce para equivaler ao peso de uma saca o outro nasce para equivaler ao peso de um grão. Assim como um peixe nasce para ser grande e outro para ser pequeno, também, um homem nasce para ser dominado e o outro para ser dominante. Entender que o peixe pequeno é destinado ao sustentáculo da continuação, seria admitir que, apesar de estarem no mesmo ambiente, o pequeno jamais se tornaria grande. É lógico que o homem jamais adotará isso como filosofia de vida; lembra-se? Ele é movido pela insatisfação. 
                                                
                      
    
 Ele
      
 No espetáculo da vida os palhaços são muitos, no entanto o público não se cansa de arriscar vê mais um. No grande circo encontramos palhaços que brincam, que pulam, que rolam, que pisam, que gritam, que calam, que choram, que vão e que ficam.
  Sabe, o bom palhaço sempre se entristece antes do espetáculo por saber que vai encontrar um público torcido e espremido pelas mãos dos robôs que se dizem humanos. Mas ele vai, vai em busca do riso e da gargalhada, querendo sentir um mundo melhor.
   É muito triste saber que como sempre, hoje, por egoísmo e maldade um corrupto e pequeno grupo ocupa o palco para sugar uma platéia já sem riso, quase sem vida, e depois se faz público para assistir a miséria de uma nação que pela lei do uso, continua sendo nutriente para o cio de desequilibrados animais. Animais estes que se contagiam pela corrosão do germe que ansia pelo topo de um monte que já não suporta o peso de mais um.

   Oh... Palhaço!
                                                                                                                                                                                                                                                                                   Repelir
     
  A espécie humana parece ser a mais fácil de dobrar, de iludir. Parece uma amostra grátis de retardados. Nunca aprende que a vida é sempre uma repetição das tragédias em cada geração. Que desde os primeiros tempos a igreja e o poder sempre se uniram para tirar parte dos bens e dos direitos da nação. Só não sabe disso quem nunca se interessou em diferenciar entre o resto e uma porção anormal. Esse resto não aprende nem mesmo com exemplos semelhantes ao dos cadáveres vivos da Etiópia, Somália e os do resto do mundo. Nem mesmo vendo crianças deficientes e cegas, vítimas da desnutrição. Só não desperta o surdo, o mudo, o bloqueado. Se a porção vive bem, o resto não conta?
   Na última guerra mundial um Hitler flagelou e eliminou milhares de seres humanos. Se ele usava câmaras de gás campos de concentração, hoje, a nossa porção elimina o resto, a curto e a longo prazo, pelo descaso, imergindo-os nos dejetos que sugam para a exclusão da vida; montando assim uma exposição onde podemos observar quadros refletindo o privilégio da ascensão, e outros, o limite da sobrevivência. Estes últimos são opacos, pois entre suas molduras estão imagens turvas de frágeis e deprimidos à mercê dos que pregam a “justiça social.”


 Peleja
    
  No início, são sonhos impulsionados pela força da inocência, que por algumas vezes faz chegar ao ponto almejado, não se sabe se apenas por acaso ou por certa predestinação. Ao cair do sonho, também cai o véu, revelando a trilha a seguir. Num segundo estágio, a grande maioria fica a degustar o sabor da desistência ou da falta de oportunidade. Já os que seguem cavalgando, vão num galope mais lento, precavidos de alguns laços, sem se expandirem na crença de que basta molhar-se na persistência da busca, mas sim, selecionando alvos a seguir; e por vezes são alcançados. Pena que muitos já tardios, sem suco, meio murchos, mas palpáveis. Se vale a pena? É só somar tudo, avaliar com uma visão realista, e colocar na balança o que sobrou da peleja; por certo, muitos verão que se colocada esta amostra numa moldura, seus fragmentos retratarão apenas os tombos e a teimosia pelo equilíbrio. E talvez, no esforço de dizer que algo valeu a pena, uma grande porção, tenha que olhar só com os olhos do peito, já que este é o único meio de enxergar a esperança.

                                                                                                                               
 Véu

 São muitas as vezes, que basta um olhar para que o encanto envolva a gente..., que pena faz, vê o dia-a-dia, desnudando o que havia por trás do véu, e fazendo trocar o sentimento que nos complementa pela busca do entender quando e quem errou.

                                                                                       Emoldurar
      
      A partir do nascer, o convite é para a molduragem. Começa a missão dos que lhe rodeiam, e depois, a vida, com as personagens necessárias para a dilapidação emergente, começa o seu  processo de moldagem para o ato fim. Os primeiros tempos são destinados à diferenciação do ser, e o passar dos tempos, à aprendizagem para ser. Os inscritos são predestinados a aprender e ensinar a inserir e cravar o mistério do crê; os não escritos, são      predestinados a mostrar a porta e o caminho largos para a satisfação urgente e a realização do prazer. Ambos, inscritos e não, são imprescindíveis num trabalho em paralelo até o ato de emoldurar e aguardar a exposição.                                                                                                      Depois da tarefa, os não escritos, como também são criaturas e contribuíram para os “ai daqueles”, irão aguardar os tempos da regeneração ( Mt 21:31, Mt 10:14 ).                                                                                                                                                                                                                                                 
Sopro

Mesmo sabendo que uma grande facção é astuciosa e se faz diferente pela prática abusiva da manipulação, bafejando o refletir do valor moral de uma nação, tornando em vão o sacrifício da busca pela libertação, e que o caráter vem do brotar e não da educação, ainda assim, pensar que pode transformar é o que dar significado, força e razão àqueles que acreditam no sopro da vida.

Textos de/para reflexão


Textos de/para reflexão
               

Naquele instante

Ferido e caído, sem forças pra levantar; apenas tentando continuar; sem o menor resíduo de resistência; sem a menor possibilidade de suportar sobre si mais um grama; desfalecido, entregue ao momento desencadeador do concreto e do abstrato; entre o sólido e o abrir as asas para o desconhecido; entre o inspirar e o não liberar a expiração; entre o continuar e a terminação; completamente entregue ao minúsculo instante da extração do que se tritura para liberar o sumo; entre a filtração do insubstancial e a substância; no momento último do fim e o iniciar da devolução; no escapar do ajuntamento de uma fenda; bem aí, logo aí, a vida desvia o olhar e alheia-se à cruciação.
Então, o que pode nos aliviar?
Alguém responde: a esperança de que Ele nos volte Sua face e mais uma vez diga: “num ímpeto de ira, por um momento eu escondi de você o meu rosto; agora, com amor eterno, volto a me compadecer de você” (Is 54:8).
                                                                                                                       
                    
        
Senão ...

  O que diz o espinho quando fura a mão que se direciona à flor?
 O que quer a fonte com a insistência de vencer obstáculos até ser envolvida pelo abraço do mar?
  O que custa à semente a missão de produzir nova vida?
  O que faz alguém sacrificar sua identidade para que os outros se identifiquem?
  O que faz um pai sombrear seus sonhos para que a vida seja refletida na realização de seus filhos? E a mãe, que logo após o sacrifício do parto, se reconstitui aconchegando seu recém-nascido?
   O que moveu o Criador a nos criar à Sua imagem e semelhança?
   O que nos deixa em ruínas quando somos separados de alguém que nos faz bem?
   O que diz o último suspiro quando o corpo decide não querer continuar?
   O que diz o lamento na hora do aceno de um adeus?
   O que diz o abraço na hora do tão esperado encontro?
   O que nos revela a ansiosa espera por nossa outra metade?
   O que é o ato de misericórdia, de compaixão, de ser solidário ou de dar a mão?
   O que é capaz de reerguer alguém depois da decepção?
   O que é o vínculo que faz unir dois seres, fiando o destino de duas vidas?
   O que é o selo que identifica a renovação de uma vida?
   O que é o pôr do sol, a noite de luar, o cancionista melodiando sua inspiração?
   Ah! O que é o recheio da vida senão o amor?                                                                                                                                       
  Avesso


No nosso caminhar o tempo e trajetar a vida, encontramos pessoas que passam, outras que vão e outras que ficam. Muitas andam na mesma direção, mas poucas no mesmo sentido. Algumas até tentam o lado a lado, mas por falta de obstinação e na ânsia de antecipar o futuro, ficam a degustar o instantâneo enquanto roem a vida.
Nesse processo de escalar o tempo e “alcançar” o que a vida tem a oferecer, os cruzamentos prescritos nos jogam no peito pessoas que por vezes nos arrastam pelos encantos que parecem ter; e alheios à dor que podemos sentir, esses prescritos mostram que o calendário da convivência faz cair o véu e revelar o que por trás dele parecia puro e perfeito; e depois de dissolver o fascínio e  desnudar o belo, faz este mostrar seu avesso e expor o que nos tira o sorriso; e ainda, como castigo, nos força crescer e, com o coração ferido, entender que, se as expressões dos nossos sentimentos não conseguiram fiar o vínculo naquele que de nós se desgarrou é porque a vida nos destina, ainda, a outro caminhar...
    
                                                                                                                                     CRUZADOS


Pensar em se libertar do que o destino em silêncio nos traçou, é inocente e  em vão. Relutâncias há, mas escorrem do domínio das mãos. Absorver esta percepção é necessário para não se deixar esvaírem os pontos ingredientes da porção; pois a vida é uma maratona e a estrada é percorrida por etapas; cumpri-las e chegar ao topo, dispensa tempo para a rejeição. Assim, não vale a pena retardar o cruzar dos pontos de interseção, mas sim, trilhar pela trajetória demarcada e colher o que já se alcança, pela prescrição.

                                                                                                                                   
          DESFOLHAR                                         

       Há intervalos na vida em que fantasias e encantos são desnudados à medida que o amadurecer, vai enxergando o avesso das perspectivas mais almejadas. O que parecia tocável, com o desfolhar do tempo é distanciado ou esvaído do nosso alcance.
 Há entrefolhas impiedosos e alheios à nossa condição humana; ignoram nossos limites e, impondo novo reinício, sem entremeios para estágios e simulações, nos levam a identificar a saída, ainda embaçada pelo véu da incerteza e o abstrato da insegurança.
 Feliz é aquele que consegue adestrar seus dias e, na fluidez do tempo, reconstituir-se e sentir conforto, desfolhando o diário do início e fim de histórias e criaturas.


                                                                                                                            
   DE QUE VALE...?


     Que satisfação tem o pássaro de belo canto, se não atrai a fêmea que está no cio? Seria esta a razão do canto triste do uirapuru?
Que satisfação tem a cachoeira, se não atrai o olhar daquele a quem está a respingar?      
Que satisfação tem a frondosa árvore, se seu sombrear não areja a quem está a fadigar?
Que satisfação tem a mais alta montanha, se lá do topo, seu olhar é solitário?
Que satisfação tem a boa música, se não comove quem a inspirou?
Que satisfação tem a flor, se antes de murchar, não atrai um polinizador?
Que satisfação tem a bela mulher, se, com seus apetrechos, não consegue canalizar a admiração e o desejo daquele a quem pretende imanizar?
Que satisfação tem o tempo, se o pular das horas não impulsiona nem vincula ninguém ao verbo amar?
Que satisfação tem aquele que, ao se recolher no seu ninho, não tem a quem se aconchegar?
Que satisfação tem aquele que, ao ter por perto o que lhe acende a chama, é coibido sorver o que lhe inflama?
Que satisfação tem aquela que, na seqüência do “estradão”, inaugura o romper do “véu” sem fiar a pureza do sentimento recíproco?         
Que satisfação tem o poeta, se sua flecha não crava a maçã almejada, nem sua saliva prova o sabor da sua imaginação?
Que satisfação tem  aquele que flui a letra e o canto, quase sacro, se não frui da relíquia que o inspirou a compor a canção?


                                                                                                             
      Renascer... 

  Estou indo, aonde ainda não sei, mas espero descobrir num fechar e abrir de olhos. Nem sei também o que será pior, se largar o fardo ou ir rumo ao desconhecido. Certo é que, lamentar não devo. É que, fora algumas boas companhias, todos os demais petrechos que a peleja me proporcionou, não valeu por um só dos reincidentes coices que a vida me deflagrou.  espero que a próxima fase seja algo sem tombos e machucões, nem períodos desoladores. O que temo, se vier renascer é: para que lado o Senhor da ressurreição me puxará?

 Sobre a fase já terminada, digo-lhes que tentei viver tudo que a vida não me permitiu, mas vivi quase tudo que não queria viver. Com as proporções a mim concedidas jamais completaria um todo, por minúsculo que fosse. Condensar um fio de fé capaz de minar córrego e arejar densas esperanças, foi o que mais busquei em oração e conversa a dois, em vão... e a promessa de sondar o coração, não me pareceu cumprida. Sonhei com horizontes coloridos, mas recebi o papel dos reprimidos.  Nasci para viver... sem saber, recebi as regras do recolher-se e, quase morrendo, tive que ser aprendiz. O que ainda me contenta é outra promessa, que diz ser vitorioso todo aquele que perseverar até o fim.

      Diante do instante sem opção, parto para o incerto com a certeza de que, lá também não terei direito de escolha, apenas aguardar a pronúncia do dito final.   

                                                                                                            
 Recantos

 Se a vida me dissesse que é generosa, eu lhe diria que não é humana. Que é ferrenha na forma de distribuir a destinação dos seus residentes. Determina a multiplicação dos seres para sua tirânica satisfação; destina seres inocentes e indefesos aos recantos mais indesejáveis e lhes impõe limitações; coage-os a margens onde só os roedores se sentem bem. Trata-os como refugo de um produto que passa por uma classificação e o resto é jogado à putrefação. São repugnantes os argumentos de que eles serão exaltados na “reciclagem” da renovação. É sem sentido expor um ser amado ao sofrimento e depois de esfacelá-lo se fazer seu salvador. De que precisa ser ele perdoado? Ora, se aos ecos de dor não merecem dar ouvidos, que sentido tem o cálice da cruciação? Que utilidade tem o remédio se é dado quando não há mais dor?  
                                                                                   

Amar tem limites

Você seria capaz de amar, incondicionalmente?
Se sua forma de amar é se doar de forma exclusiva a alguém que sequer avalia teus sentimentos, é bom parar, refletir, e tentar aprender com quem criou e com quem entregou a vida por amor. Ele vai te ensinar que quem ama é ciumento e exigente: (“... Não se proste diante de outro deus, porque Javé é ciumento: ele é um Deus ciumento. ...”, Ex 34:14 ...) e não abre mão da fidelidade; reclamações então... nem murmúrios!  (Nm 21:4-6); exige glória, mesmo quando parece estar dando migalhas. É como se o ar e os poucos grãos, já fossem o bastante. Mesmo amando muito seus filhos, quando estes, em sofrimentos, lhe pedem para aliviar suas dores, Ele não se joga, na pressa do livramento. Foi assim em todo o Êxodo. Quando Paulo, sob espancamentos, lhe pediu por três vezes para que o livrasse do que ele chamou de espinho na carne, quem mais o amava disse: “Para você basta a minha graça” (2 Co 12:9...). Isso mostra que, amar não é isentar o outro de retribuição. Se a quem ama cabe dar amor, a quem é amado cabe mostrar que merece o amor recebido. Se o amor fosse algo incondicional, Deus não teria feito cair o anjo rebelde com sua corja. O apanhar e oferecer a outra face é apenas, para quando for necessário fazer refletir e surpreender o agressor.
O Filho, quando veio nos visitar, trouxe as regras da justiça e da harmonia para a boa convivência, e com o segundo mandamento, ensinou a amar, mas não deixou de alertar que, primeiro deve ter amor próprio: “ame ao seu próximo como a si mesmo” (Mt 22:37-40); ensinando assim que, quem se ama, não pode amar qualquer coisa, nem de qualquer jeito. Portanto, ame à medida que for amado(a) e doe-se à medida que receber. Com certeza, irá descobrir que apesar de tudo, mesmo entre espinhos, a vida tem favos ainda com mel, para vigorar teu corpo e alma, e te ensinar as várias formas de conjugar o verbo amar.
Amar não é se dissolver para matar a sede do que chega com o: “ô de casa!” e vai-se deixando rastros indesejáveis.

A versão original do amor é outra, é condicional e depende do SE: “... Purifiquem-se... Então venham e discutiremos. Ainda que seus pecados sejam vermelhos como púrpuras, ... SEEE vocês estiverem dispostos a obedecer, comerão os frutos da terra; mas, SE vocês recusam e se revoltam, serão devorados pela espada.” (Is 1:16 ...).
Fora do SE, são adereços e variações acrescidas para favorecer a instintos que só aprenderam manipular. 

                   
 Reviver

Quando a vida me faz cair e arrasta-me por veredas indesejáveis, e sinto estar sendo consumido pelo vácuo do peito, sou levado a me recolher, e este recolhimento aponta-me o teu colo, no qual, choro baixinho aos ouvidos do teu coração, quando os cochichos deste, acalentando-me,  me recompõem e me fazem ver que as quedas, são apenas rascunhos de uma página que juntos, passando a limpo, iremos escrever. 
                                                                                                                                                

Reclamos do corpo e da sede da alma


    Tenho sede

       Tenho sede. Não do líquido que por sua falta leva o corpo à desidratação, mas aquela que inflama a carne, e no suor dos corpos, já fez Eva valer mais que o paraíso, quando expôs suas polpas proibidas a Adão; que já fez o desejo do Faraó ser maior que a honra de Abraão, que já fez o grande Davi, pelo corpo de Bate-Seba, sujar sua honra e pôr em risco sua unção; que  já fez até o mais sábio dos homens, Salomão, perder o equilíbrio, e se lhe fosse opcional, trocaria seu harém pelo corpo da rainha de Sabá, mesmo este harém lhe oferecendo mil mulheres, entre esposas e concubinas. Ah! Como deve ter ardido o ciúme de Abraão, o desejo de Salomão e a fúria do rei grego Menelau, que sentiu dor maior que Aquiles, ao saber que os ingredientes de sua Helena foram ser deliciados por outro paladar. E quanto a mim... um ser comum e pequeno em sabedoria? Ah! Treme o corpo, arde o peito, vai-se a razão... e fica o santo e maldito desejo, a mendigar as porções das proas e das bordas proibidas.


Sede ardente

Tenho medo de que não tenhas por mim, o sentimento capaz de ler em meus olhos, os escritos de desejos ardentes, ditados pelos ecos retraídos do coração, que tremendo, suplica por teus lábios, que mesmo inibidos, deseducam meu desejar e inflamam a sede que me consome. 
Não desvie seu olhar do meu, nem espere meus lábios sussurrarem segredos, pois as palavras se atropelariam e não diriam da intensidade do desejo nem da pureza do sentimento.


 Queria ser

Queria ser estrada, aquela por onde desejas trilhar; e quando os quereres te estimularem, ser o atalho no caminho para antecipar teu cio e dobrar a viga do teu viço.
Queria ser o sussurro que ao teu ouvido, quando em dúvidas, indica a direção e o sentido a tomar.

Queria ser o alvo que, mesmo nos momentos de olhar turvo, consegues enxergar.
  
Queria ser iluminação para, mesmo nos momentos opacos dos teus dias, te fazer brilhar.
  
Queria ser turbulência para te remover dos momentos em que a esperança parece não ter amanhã, e te condicionar à exaltação.
  
Queria ser teu refúgio e o cochicho no coração capaz de te reerguer quando os dias pardos da tua vida tentam te fazer fraquejar.
  
Queria ser o instinto que impulsiona teus passos, e quando trêmulos de querer, rumá-los ao meu desejar.
  
Queria ser o silêncio do sol num entardecer, e soprando rumores ao teu coração, conduzi-lo à sede de me querer.
  
Queria ser o ponto final do instintivo que te incita ao ato sacrossanto da desobediência, e em êxtase, no éden, podermos libar a essência do nosso espojar.


 Sedução
   
 Enlevo que me incita, domina minha mente, fende meu peito e contrai o coração; e que, com seus discretos e naturais petrechos, embriaga-me só de pensar em escalar seus montes, tragar seu “vinho” e ser embebido nesta ondulação. Deixe vigorar o que o instinto sente; não retraia o que se aflora nem contenha os impulsos levados à mente; desgarre-se do que se impõe, negando-te a engrenagem dos dias futuros. Busque O desfrute, do qual o Sagrado empenhou-se tanto para dar o encaixe da procriação humana; pois, o não permitido, deixa de ser culposo e se torna venerável quando, se agasalham desejos sinceros, compromissórios e sentimentos puros. Tanto é que, quando David parecia ter cometido o mais grave dos pecados, nasce dele e de Betsabéia, o fruto que, dentre os homens, recebeu do Dono da Vida, a maior sapiência; mostrando assim que, quando o sentimento é intenso e sem malícia, cabe aprovação d’Aquele que providenciou o cruzamento de um, na vida do outro.


Fatia

Se a vida te entranhar de corpo e alma em mim, direi a ela que já tenho o usufruto da melhor fatia que a mesma tem a oferecer. Dir-lhe-ei que, depois de pedir para eternizar o tempo, só terei a lhe agradecer por ter me dado a mais preciosa e prazerosa das recompensas pelos dias vividos aqui. Pois ela sabe que, te quero tanto, quanto o rio necessita transbordar, para alcançar o mar.


Vida?
   
“Cumprir a vida” sem ter o que um olhar acanhado e retraído clama..., sem sentir o calor molhado da pele desejada..., sem o encaixe dos corpos em chama..., sem provar o lambuze dos lábios que se umedecem..., sem dar às mãos o prazer do deslize na busca do ápice corporal...; é transitar todo o viver sem provar da essência que os extremos expõem; é amaciar o favo imaginando lamber o mel; é esperar o fruto da flor sem expô-la ao polinizador; é querer fertilizar o solo quando a fonte já secou; é querer frondejar um tronco que já não conduz a seiva; é querer aflorar sentimentos num coração que, ao concluir seu tempo, sente que só acolheu no peito as cascas da vida.

    Inibido

Das lutas que travei e dos caminhos que busquei, a vida pouco me proporcionou. O destino fez seu jogo, brincou de mostrar o rumo e insinuou, expondo seus sabores; porém, das porções que alcancei, quando ingeri o sumo, a essência já se esvaíra. Quando  meu estame quase  inaugura o pistilo da flor, dela não fui o polinizador. Quando quase residi, fui despojado, inibido; pois, do alimento que mais tive fome, não consegui comer; o pecado original que mais mendiguei, não consegui cometer; da fonte que mais tive sede, não consegui beber. E foi neste brincar de expor e negar, que do fruto que mais desejei, não consegui provar; no desnudo que mais me enfeitiçou, não consegui tocar; o saliente, pequeno e encoberto, que mais quis sorver, não consegui desvendar; na “fenda” que acendeu minha cobiça, não consegui penetrar. Assim, nessa trituuura, a seiva que vitaliza o viço resseca, retrai a libido, ofusca o ser e turva a mira perseguida. No entanto, ainda assim, mesmo sabendo que este sentimento fende o peito e desordena o coração, espero ser movido, extasiado e embebido pelo gameta dessa flor, e nesse enlevo, colhê-la no agasalho desse vicejar.



Atraído pelo teu cio (Fragmentos)

Tu que tens a seiva que revitaliza meu viço;
Tu que me atrais pelos lábios horizontais e me leva a imaginar tocando as carnudas bordas verticais;
Tu que encharcas minha sede e implantas a ânsia de te querer;
Tu que, exibindo teu ondular, ressecas minha íris e incitas meu hidratar;
Tu que excitas meus desejos e os faz sussurrarem reclamos ao  peito, do silêncio e da contenção;
Tu que me dás  água na boca por querer provar deste mel que poderia ser o prêmio a compensar os amargos da vida;
Tu que tens o que há muito não despertava minha cobiça;
Tu que me desequilibras quando estável, me causando aperto no peito, dificuldade de respirar e perda da razão;
Tu que, com tua faceirice, despertas meu latejar;
Tu que, com esse ar de “inocência”, reacendes a chama, já quase em cinzas, e me elevas à conduta do “pecado original”;
Tu que causas ciúmes à flor do campo e deseducas meu desejar;
Tu que, com este olhar, no momento oportuno, sabes dizer e pedir o que deseja o coração;
Tu que, com este relevo corporal de saliências agudas e onduladas, me devoras, a você eu rogo: se me percebe, não queira escravizar este seu réu; não queira ver meu fim nem me ver murcho; leve-me a caminhos por onde ainda não trilhei; ouse ao menos por um instante, quebrar a timidez e fixar o olhar em mim que, ainda inibido, aguardo o confluir dos corpos, pois, bêbado de sede e inquieto, espero de forma emergente, o momento de tateá-lo; e neste desequilíbrio entre o corpo e a razão, fico na relutância de neutralizar os estímulos, que por vezes, me vencem e arrastam-me à sua dominação, e neste encanto, fico ávido e tonto só de pensar em escalar seus montes, tragar de forma voraz seu “vinho” e ser embebido por sua ondulação.

Meio
                         
Entre o inspirar (nascer) e o expirar (morrer) há demarcações tais que, se avisados, não avançaríamos um passo sequer, ou desfolharíamos os entremeios buscando antecipar o por vir; pois há etapas do iirrr que a soma dos trechos mais floridos, não valem por um só caminhar nos espinhos. No percorrer os trilhos da busca, somos expostos às arenas da vida sem o manual de saídas, e tontos, veredamos num tatear abstrato, com um farejar inodoro, tentando sentir o insípido, pelejando seguir as pegadas do tempo, rumo ao que pensamos ser o nosso complemento. Movidos pela busca da parte que nos falta, por vezes saciamos nossa ânsia com águas temporárias pensando correrem da fonte; mas com o esvair do córrego, volta o vazio e, com ele, desfigura-se a ilusão.

  
Tangência
                               

   Pobre daquele que a vida resolve brincar com seus sentimentos, traçando rabiscos que fazem cruzar no seu caminho, pessoas que cruciam seu peito e o fazem lacrimar, e se vão como se para elas tivesse sido apenas um tangenciar. Culpa delas? Não! Mas de alguém que coloca num peito, um coração “bobo” que, por amor, é capaz de sangrar. E o pior, é que, quando aquele pensa ter se recomposto, ela, a vida, mais uma vez rabisca e o faz pensar: agora é o lado a lado, não é mais um cruzar. E assim, esse “gracejar” da vida vai machucando e fazendo murchar; vai esvaziando o vigor e ressecando os condutores que fazem brotar a essência naquele que necessita recomeçar. Em cada acordar da queda, o reconduzir-se é cambaleante; pois neste ferir-se e cair, se foram pedaços, e para reconstituí-los é preciso tropeçar em alguém, que seja andarilho da mesma estrada, e que ande no mesmo sentido do seu caminhar.